Seis dias nos porões da humanidade, lembranças de Carlos Mesters — Editora Vozes, 1977, 2ª edição *
Ceará, 16 de novembro de 1975.
Segunda-feira da semana passada, 10 de novembro de 1975, às 6 horas da manhã, saímos da sede da paróquia para visitar a comunidade de Areia Seca, que fica na serra entre Ceará e Piauí. Lá passamos seis dias, até ontem, sábado, 15 de novembro, para visitar o povo, administrar os sacramentos e celebrar a missa. Éramos três: Teresinha, Irmã Maria, ambas da equipe paroquial, e eu. No sábado, bem cedo, partimos para São José do Morro Santo, onde, hoje cedo, domingo, Administramos os sacramentos. Hoje à tarde, voltamos para a sede da paróquia.
Foram seis dias de muita confusão e trabalho. O descanso só veio agora no fim do sétimo dia, já bem perto da meia-noite, precisamente na hora em que estou começando a escrever este relatório, ajudado pelos rabiscos feitos em alguns momentos perdidos durante a viagem. Nestes seis dias tive a impressão de ter descido num dos porões da humanidade. Um porão só! Um entre os milhares que existem no Brasil! Há milhões deles espalhados pelo mundo! Porões, onde se faz o trabalho escravo para sustentar as pessoas que moram na casa, erguida em cima dos porões. Um porão é escuro. Nele só se acende a luz, quando o dono da casa aí desce para apanhar alguma coisa. Um porão não tem muita ordem. Lá são encostadas as coisas, aguardando o uso que delas venha a fazer o dono da casa. Costuma ter poeira. A limpeza só se faz uma ou outra vez. Lá dentro, as coisas se conservam sem lógica e muitas vezes, sem destino. Muita coisa se passou na minha cabeça nestes seis dias. Não posso lembrar de tudo, mas quero escrever, para o meu uso e consumo, o que ficou gravado na minha memória daquilo que vi, senti e vivi por ai. Vou descrevendo os fatos, conforme a sequência dos dias, entremeando as reflexões e lembranças que eles suscitaram em mim e, sobretudo, as interrogações que colocaram em mim, desmantelando um bocado de coisas. *Por ora introduzo a apresentação dos dias que Carlos Mesters viveu a humanidade de Areia Seca. Aos poucos eu postarei mais. Carlos Mesters
Enviado por Germino da Terra em 12/02/2013
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